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Solitária numa cidade estrangeira, uma mulher no começo da velhice se dedica a tarefas corriqueiras. Observa o voo dos pombos no pátio, frequenta a piscina, marca consultas médicas que considera cada vez mais urgentes. Mas, dentro de casa, empreende uma atividade peculiar, quase clandestina: lê os diários de seu pai. E escreve suas próprias linhas nos versos das páginas. O contato entre as duas grafias vai desvelando as pistas de uma história sempre incompleta.
Mar azul retoma alguns dos elementos que consagraram Paloma Vidal como uma das vozes mais marcantes da prosa brasileira contemporânea. A memória – zona opaca de elipses e de impasses – é pedra de toque para uma trama que nunca se deixa ver por inteiro. No compasso melancólico de um cotidiano marcado pelo exílio, o passado ressurge em fiapos, peças de um quebra-cabeça naturalmente movediço, no qual os nomes de personagens e cidades, a cronologia ou os fatos não exigem evidência; em geral, não passam de insinuações.
A ausência e o luto, a distância e o esquecimento pairam sobre Mar azul. Apenas a água, o oceano e as lembranças de uma viagem à praia parecem um norte possível, alento para a dificuldade de fixar afetos e decifrar as próprias dores. A solidão – fruto do hábito paterno de estar sempre de partida – aproxima a protagonista de Vicky, que se tornará sua melhor amiga. É a experiência desse convívio que abre o livro, cujas primeiras páginas são tomadas por fragmentos de diálogos entre as duas, ainda adolescentes.
São diálogos forjados pelo constante jogo de revelar e esconder, inquirir e insinuar, contornar o perigo e as ameaças secretas com um jeito ora titubeante, ora luminoso. Nesse jogo, perseguem a dúvida como elemento precioso e aflito da intimidade, enquanto refletem a identidade, marcada simultaneamente por vertigens de silêncio e ímpetos de violência, de quem foi jovem na América Latina, em algumas décadas do século passado.