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O lustre é, provavelmente, o livro menos conhecido de Clarice Lispector. Publicado em 1946 e reeditado pela última vez em 1976, o livro não foge às características que consagraram o estilo único de Clarice: o delicado tom intimista pontualmente quebrado por perturbadoras metáforas, a exposição impiedosa da alma humana sem que sejam revelados os mistérios de cada personagem.
Em O lustre a sensação de inquietude é ainda mais intensa. Trafega-se, a maior parte do tempo, pelo mundo interior da protagonista, Virgínia, desde sua infância numa fazendola em um remoto vilarejo do interior até a vida adulta numa cidade grande e solitária. Clarice não permite ao leitor jamais ter completo acesso ao que se passa do lado de fora — a não ser na crua e, talvez, surpreendente cena final. No universo subjetivo da escritora, a única clareza está nos sentimentos. Virgínia ama seu irmão, Daniel, sua alma gêmea, seu senhor. Virgínia ama seu amante, Vicente, a quem conhece tão pouco... A história é contada como num jogo de luzes e sombras, cada parágrafo permitindo apenas antever, de relance, a força sufocante de tanto amor.
Clarice Lispector terminou de escrever O lustre em Nápoles, no final da II Guerra Mundial, onde estava acompanhando o marido diplomata. Numa carta, o escritor Lúcio Costa criticou o título do livro — achou-o muito pobre para a rica personalidade de Clarice. "Nunca consegui mesmo convencer você de que eu sou pobre", respondeu ela. E completou, tristemente irônica: "Infelizmente, quanto mais pobre, com mais enfeites me enfeito. No dia em que eu conseguir uma forma tão pobre como eu o sou por dentro, em vez de carta, você receberá uma caixinha cheia de pó de Clarice."
O lustre, como os demais títulos de Clarice Lispector relançados pela Rocco, recebeu novo tratamento gráfico e passou por rigorosa revisão de texto, feita pela especialista em crítica textual Marlene Gomes Mendes, baseada em sua primeira edição.